A Grande Convergência
Por Sandro Guidalli
As empresas de comunicação no Brasil têm uma mania: a de cooperar com governos recém-eleitos, aproveitando-lhes a popularidade de estréia para obter dividendos que vão além das reforçadas verbas de publicidade estatais. Isso tem um nome: adulação precoce. Mas quando os novos donos do poder são do agrado e simpatia dos jornalistas que labutam diariamente nas redações e que de uns anos para cá detêm o controle editorial daquilo que estará nas bancas no dia seguinte ou nos telejornais da noite, temos aquilo que se chama de "a fome com a vontade de comer".
Se aos empresários é prudente manter boas relações com Brasília, esteja lá quem estiver, aos editores e repórteres a conveniência é maior ainda quando por lá assumem burocratas esquerdistas, antiamericanos por natureza e revolucionários por velha opção. Bajular Lula e exaltar suas primeiras ações, tornando fatos negativos em positivos, desastrosos em bem-sucedidos, é a tônica da mídia brasileira desde que em outubro o PT saiu vitorioso das urnas.
Mas que fique claro: há exceções. Elas não significam publicações inteiras, representam uma reportagem aqui, outra acolá. Se elas não atenuam o surto do que já chamei de o mais impressionante "chapa-branquismo" na imprensa, servem para prová-lo. E isso não é pouca coisa.
A revista Veja desta semana, por exemplo, trata de forma sóbria e crítica o lançamento do programa Fome Zero. O título: "Fome Zero, Confusão Dez". A publicação da editora Abril relata as turbulentas circunstâncias da elaboração do projeto, cita seus principais defeitos e evita o característico oba-oba em torno de Lula e o PT de suas similares, como Época e Istoé Dinheiro.
Comparado à Veja, o jornal Valor Econômico da última sexta-feira é um panfleto partidário ou órgão oficial de imprensa editado diretamente da secretaria de Comunicação do governo.
Em manchete de capa o jornal já revela seu pendor governista: "Lula conservador, firme e ousado no primeiro mês". Assinam a reportagem Claudia Safatle e Marcelo de Moraes. Na página interna, o repórter Sergio Leo contribui para a imagem positiva do governo escaneada pelo jornal. As trapalhadas do PT no campo da política externa, principalmente no caso venezuelano, viraram "um sucesso inegável" e marca da estréia do novo "e bem-sucedido" presidente brasileiro.
O "Fome Zero" e suas confusões, além de sua inegável característica populista e marqueteira, transformou-se num programa ousado, nascido "sob forte polêmica" com "discutível viés paternalista". Sejamos compreensíveis: o "discutível viés paternalista" foi uma concessão da reportagem, já que é realmente impossível fazer crer que o projeto é algo maravilhoso e irretocável como ela o desajaria.
De volta a Venezuela, Valor afirma que a intenção de Lula e do assessor especial, Marco Aurélio Garcia, é a de executar uma política externa "pragmática e multilateral". Faltou dizer que o pragmatismo foi logo percebido com a escancarada ajuda ao governo Chávez e o simultâneo desapreço à oposição, chamada de "golpista" por Garcia assim que o ideólogo petista desembarcou no país vizinho em "missão especial".
Quanto ao multilateralismo, este ficou curiosamente limitado aos aliados do Foro de S. Paulo sobrando um pouco dele para a França e a Alemanha, as duas solitárias potências européias em defesa de Saddam Hussein. Como podemos notar, estamos diante de uma inusitada convergência de interesses. A dos jornalistas, pró-petistas e a dos empresários, donos de jornais e TVs, sempre dispostos a "colaborar" com o novo governante ainda que seja preciso, para isso, sacrificar os fatos. Eles que se danem.
Por Sandro Guidalli
A revista Istoé Dinheiro trata do mundo corporativo capitalista mas tem verdadeiro horror dos Estados Unidos, paradoxalmente o mais bem-sucedido país do mundo e fonte principal de qualquer publicação que se dedique ao ambiente dos negócios. Na edição desta semana, seu diretor de redação, Carlos José Marques, escreveu, entre outras coisas, que está comprovado o interesse de Washington pelo petróleo iraquiano e que este seria o único e verdadeiro objetivo da iminente guerra contra Saddam.
As coisas nas redações brasileiras andam assim. Os atentados de 11 de setembro tornaram-se tão distantes que parecem sequer terem sido realizados pela rede internacional de terroristas da Al Qaeda e que tem entre seus financiadores justamente a mais nova "vítima" dos "falcões" americanos.
Que esta visão parcial e infantil do mundo venha sendo a tônica da mídia brasileira em telejornais e jornais de abrangência editorial ampla vá lá, estamos acostumados com isso. Mas que ela seja o pilar editorial de uma revista dedicada ao mundos dos negócios é algo realmente inusitado. E mais, que ela seja escancarada numa carta de seu editor aos leitores, presume-se, do mundinho capitalista brasileiro, é um espanto.
Escapa à compreensão do editor Carlos José Marques aquilo que é óbvio no mundo da realidade mas que parece propriamente nebuloso no da fantasia em que está megulhada a redação da Istoé Dinheiro: Bush está tentando salvar a pele dele e a de seu país rompendo uma das principais fontes de tensão do mundo, baseada em Bagdá e cujo poder de destruição é desconhecido em intensidade mas não em qualidade. Se o petróleo que jorra no Iraque será administrado pelos EUA depois da eventual queda de Saddam, isso é algo secundário para o mundo. E não é, absolutamente, o motivo do previsto ataque ao Iraque. Pois antes de ganhar dinheiro com o petróleo é preciso estar vivo, ora bolas...
O antiamericanismo que está entranhado na mídia brasileira produz coisas assim: um primor de desinformação e muitas doses de rancor e inveja. Se eu fosse assinante da revista Istoé Dinheiro, perguntaria ao seu editor se há algum lugar na redação para alguém que defenda a liberdade, o capitalismo e seja, finalmente, alguém que deplore o terrorismo, esteja ele voltado contra Nova York, o Togo, a Malásia ou Copacabana. Mas na revista que qualificou o Fórum de Porto Alegre de "o encontro dos excluídos" só há lugar para novos e velhos comunistas.
O verdadeiro isolamento Aqui
Guidalli.com informa:
O departamento de Inteligência de Guidalli.com descobriu mais detalhes sobre outro cubano em visita ao FSM. Trata-se do presidente do ICAP-Instituto Cubano de Amizade com os Povos, Sergio Corrieri. Mas, afinal, quem é a figura?
Sergio Lucio Corrieri Hernandez é membro do Comitê Central do PC Cubano desde a década de 80. É Presidente do ICAP desde outubro de 90. Na década de 80 foi Primeiro Vice-Presidente do Instituto Cubano de Rádio e Televisão. Em outubro de 1997, no 5º Congresso do partido, foi reeleito membro do PC. Em 24 de fevereiro de 1998 foi eleito membro do Conselho de Estado, órgão com 31 membros do qual faz parte Fidel Castro. Como já dizia o Hélio Teixeira, lá em Curitiba, "quem tem fonte, tem tudo!"
Por falar em Cuba, a delegação caribenha ao FSM foi a maior desde que o encontro passou a ser realizado dois anos atrás. Natural, pois a "cooperação" da Ilha de Fidel com o governo brasileiro deve só aumentar este ano. Como o MST será convidado pelo Ministério da Educação a ensinar as crianças nas zonas rurais do país, pode-se considerar plausível que os sem-terra atualmente em Cuba para praticar técnicas agrícolas irão repassar o aprendizado da coletivização agrária à molecada no campo brasileiro. Portanto amigos, o Brasil nunca estará tão próximo de Cuba como nos anos vindouros. Isso é só o começo.
Nesses tempos de exaltação quase unânime da grande mídia gaúcha ao Fórum Social Mundial, falta muito para que eu também me convença de que este grande evento das esquerdas é de fato algo legal, simpático, charmoso, economicamente rentável e que preconiza um mundo melhor. Nos últimos dias basta ligar a tevê, o rádio e abrir os jornais para ver belas repórteres e eficientes jornalistas da imprensa local se refestelando para fazer o que lhes mandam os patrões: falar bem do Fórum Social Mundial. Afinal de contas, a grande imprensa sabe melhor do que ninguém farejar os ventos que lhe trarão dividendos futuros. Sempre foi assim. E não seria diferente quando um governo de esquerda ascende ao poder em nosso país. Felizmente, como ainda sou dono apenas de uma coluna na internet, um programa na tevê a cabo e vivo da renda de algumas palestras, ainda me resta um mínimo de independência para criticar o Fórum Social Mundial, ao contrário daqueles que aderiram incondicionalmente, sem dar chance ao saudável contraponto ideológico. Vai ver nem eu sei direito o porquê, mas conservo um pouco de vergonha e me nego a bater ponto num evento onde figurinhas do velho receituário comunista são as estrelas.
É claro, e ninguém é tolo de negar, que o Fórum Social Mundial movimenta a economia de bares, restaurantes, hotéis e motéis. É certo também que Porto Alegre termina sendo citada em jornais do mundo inteiro. Mas só isso basta para que todos se atirem de cabeça na defesa de um evento dessa natureza, onde o grande debate se restringe a radicais de esquerda discutindo com aqueles que são mais ou menos esquerdistas? Posso estar ingenuamente errado, mas acho que não é razoável nem por todo o dinheiro do mundo, apoiar algo que, no fim das contas, acaba servindo de estandarte para o discurso de restrição das liberdades econômicas e individuais mundo afora. Se Cuba e Venezuela são os modelos ambicionados como solução para suas nações pela maioria dos participantes do Fórum, dane-se a semana de fartura da economia local. E dane-se o faturamento dos hotéis por estas bandas. E dane-se o Fórum. O evento não me serve. E também não deveria servir aqueles que têm compromisso com a verdadeira democracia. Mas a história está farta de exemplos de falsos democratas e alguns ingênuos que de boa fé pavimentaram os caminhos do totalitarismo.
Na década de 30, a pujante e crescente Alemanha de Hitler também usou as Olimpíadas sediadas naquele país para exaltar as características de organização e superioridade “racial” do povo alemão. O mundo inteiro aplaudiu. A Alemanha virou manchete e os alemães foram exaltados como anfitriões altamente desenvolvidos. Mas por trás daquilo tudo estava um imenso esforço de propaganda nazista para consolidar o nacional socialismo. Deu no que todo mundo sabe.
Obviamente, a simples comparação destes dois fatos sugerindo que representam a mesma coisa não faria o menor sentido. Mas seria de bom tom que antes de abraçar cegamente uma causa como esta, a sociedade se alertasse para o que está por trás do Fórum, o que defendem seus organizadores e qual a razão de gente como a filha de Che Guevara, a cunhada de Fidel Castro, o arruaceiro José Bové, o representante da narcoguerrilha das FARC colombianas, o líder do MST João Pedro Stédile e o clone de ditador Hugo Chávez se sentirem tão à vontade por aqui. Só alguém despolitizado não enxerga que os líderes e organizadores do evento ainda rezam pela velha e bolorenta cartilha comunista, onde odiar a liberdade econômica é regra e sonhar com ditaduras “populares” é a meta de uma vida inteira.
Lamento, mas enquanto o Fórum Social Mundial continuar servindo de palanque para alguém como Olívio Dutra, que cortou o belo programa de distribuição de leite para milhares de crianças famintas no tempo em que governou o RS e expulsou fábricas que poderiam gerar milhares de empregos para sempre, definitivamente este evento não faz jus ao nome que leva. Também é uma piada abrigar os dirigentes da prefeitura de Porto Alegre, que boicotou o que deu os programas sociais bolsa escola e bolsa alimentação, pelo único fato de que foram criados por Fernando Henrique. E este pessoal faz discursos defendendo o combate à fome. Assim, não seria de surpreender se Fernando Collor aparecesse para discursar sobre meios de combater a corrupção.
Ou seja, não faz o menor sentido.
Que “um outro mundo é possível” ninguém tem dúvida. E ninguém também discorda. De preferência mais humano e com menos diferenças sociais. Mas isso não se consegue com bravatas. É preciso muito trabalho e, principalmente, liberdade econômica e social. Definitivamente, as fórmulas do Fórum Social Mundial, se é que existem além de discursos panfletários em tom de grêmio estudantil, não servem para tornar o mundo melhor.
Isto é, se o mundo que se quer for um mundo real.
Leitor e fonte qualificadíssima desta página lembra a este editor que a jornalista Maria Helena Malta, autora do panegírico comentado abaixo sobre Luis Carlos Prestes em O Globo foi militante do MR-8 nos anos 70. Sem comentários....
Por Sandro Guidalli
O suplemento literário "Prosa & Verso" do jornal carioca O Globo, deu mais um passo neste último final de semana naquilo que se poderia chamar de "mitificação do comunismo brasileiro". Em matéria assinada por Maria Helena Malta, o líder comunista Luis Carlos Prestes, financiado por Moscou durante décadas para transformar o Brasil numa ditadura à bolchevique, é apresentado como um herói revolucionário, vítima da crueldade do regime Vargas, o chamado Estado Novo.
Em dado trecho da reportagem, escrita em razão do lançamento das correspondências de Prestes escritas da prisão ("Anos Tormentosos", ed. Paz e Terra, R$ 50,00), a jornalista dispara: "Aí estão (no livro) as inquietações mais íntimas do secretário-geral do PCB (...) dando vida a um cenário marcado pela repressão implacável aos movimentos sociais (pelo Estado Novo) em consonância com a evolução do nazifascismo europeu".
Maria Helena Malta omite informações fundamentais para se entender o que pretendia Prestes e as razões, em função de suas pretensões, da "implacabilidade" da repressão varguista. O trabalho do ex-dirigente comunista é confundido com um movimento social, supostamente anti-fascista e que estaria sendo engendrado para livrar o Brasil da ditadura, na ocasião combatida pelo PCB, como se ele, o PCB, almejasse a reinstalação da democracia e não a ditadura do proletariado, sabe-se lá quantas vezes mais dura que o Estado Novo.
À parcialidade da reportagem sobre o livro de correspondência do homem do Komintern no Brasil é acrescentado um outro vício do jornalismo brasileiro: o de romantizar guerrilheiros, terroristas, golpistas e todos os tipinhos revolucionários esquerdistas. Assim, através da leitura de suas cartas, Prestes surge como um homem amoroso, forte e inquieto, qualidades que são frequentemente aplicadas à biografia de um Carlos Lamarca ou um Che Guevara. Afinal, um herói é feito de coragem e de ternura...
Se o revolucionário comunista tratava com amor em suas cartas a companheira de viagem Olga Benário, era algo esperado. Suprimir do contexto da correspondência, entretanto, as circunstâncias do relacionamento bem como todo o pano-de-fundo em que ele se deu é falsificar a história. Em resumo, Prestes surge como um amante injustiçado, prisioneiro da tirania varguista, impedido de fazer "justiça" sugerida pelo seu "movimento social".
Os ideólogos e simpatizantes do regime mais cruel da história da humanidade, inaugurado por Lênin naquele outubro de 1917, agradecem ao "Prosa & Verso" por tanta generosidade com o seu embaixador no Brasil.
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Editor: Sandro Guidalli