Aguardo os jornais de domingo. Posso estar enganado mas acho difícil que eles tragam análise e informação sobre as mais recentes expectativas no Oriente Médio sobre a guerra que já começou, como vimos em postagem anterior.
A principal delas refere-se ao Ramadã, o mês sagrado dos muçulmanos que começa na Lua Nova de novembro. Vejam no calendário: dia 4. Seria um risco muito grande para Washington deixar passar todo este período para só então iniciar seu ataque principal. Saddam, por sua vez, teria um tempo precioso em seu favor. Portanto, espera-se uma ação antes disso.
Enquanto o Ramadã nem os bombardeios ao miolo do Iraque chegam, é hora de imobilizar Yasser Arafat. Bons palpiteiros em Israel temem que ele se suicide ou que alguém o mate antes da hora. Quase fizeram isso ontem. Parece que o homem criado pela KGB saiu chamuscado dentro da Mukata. Pode acabar virando um incômodo herói morto o que, a esta altura do campeonato, ajudaria a onda antiamericana precipitando as coisas e desconcentrando Bush.
O fato é que a decisão do Conselho da ONU nesta segunda deverá ser favorável ao presidente dos EUA. Junte-se a isso o apoio do Congresso e pronto, será a hora de deixar a CNN ligada 24 horas por dia mais uma vez. Conversei há pouco com Nahum Sirotsky, correspondente do IG e da Zero Hora em Tel Aviv e que passa férias no Rio. Para ele, a operação americana será na base do “tapete”, ou seja, exceto Bagdá, tudo será bombardeado.
Nahum também acha que o Shin Bet irá prender Tafik Tirawi, chefe da Inteligência palestina, o cara da brigadas Al-Aksa. Imobilizar os palestinos e engasgar Saddam. Esta é a estratégia no curto prazo. Para Nahum, porém, o pior vem depois: quem colocar no lugar de Saddam? Um dos seus 23 sósias? Seja quem for, não espera da imprensa a resposta certa.
A cobertura dos jornalões do país sobre os recentes e sangrentos episódios em Ulm El-Fahm e Tel Aviv, em Israel, seguiu a linha convencional dos últimos meses: informações básicas, análise parcial, propaganda e preguiça.
É verdade que alguns poucos correspondentes, quando conseguem elevar-se sobre a batalha ideológica, às vezes se aproximam da verdade, o que salva um pouco o noticiário impresso da mesmice e da rotina que os tem reduzido à tarefa de cobrir o piso do apartamento da vizinha quando a parede dela é pintada. Vale a pena, entretanto, comentar algumas coisas aqui que o leitor provavelmente não encontrará em seu jornal preferido ao longo das edições de final de semana.
O serviço secreto judeu, o Shin Bet, andou avisando o governo e organizações próximas de que a calma das últimas seis semanas era mesmo mera aparência. Seus agentes trabalharam muito e conseguiram desaparelhar uma série de ações dos grupos terroristas árabes que andam, segundo o Shin Bet, meio desorientados e dispostos a buscarem especialistas em explosivos e suicidas tanto no Hamas, na Jihad ou nas brigadas al-Aksa. Isso os levaria a atacar em estradas da Cisjordânia e a praticar outros atos suicidas por conta do desespero.
Mas parece que a expectativa de um ataque dos EUA ao Iraque andou desviando a atenção dos serviços secretos, relaxando a vigilância interna. Não deu outra, foi o que vimos na Allemby quando explodiu o ônibus na quinta pela manhã. O que parece estar mais preocupando Israel, no entanto, é a eventual disposição de Saddam em atacar com armas biológicas atráves de um homem-bomba. A coisa pode virar-se contra os próprios árabes, é verdade. Israel devolveria a caca para além de um cordão sanitário que acabaria em campos de refugiados e para as cidades palestinas. Veremos como agirá Saddam.
Uma última questão: será que alguém, além dos jornalistas, acredita que as novas inspeções da ONU no Iraque irão encontrar indícios ou provas da produção de armas atômicas ou algum laboratório químico em atividade na periferia de Bagdá? Será que quatro anos sem a presença das Nações Unidas por lá não teriam sido suficientes para camuflar e esconder tudo?
Empenhados apenas em repetir o mantra em favor da ONU e do Iraque de um lado e contra Bush e os Estados Unidos de outro, os jornalistas brasileiros que editam e escrevem os cadernos ou folhas destinados ao noticiário internacional mostram-se, na verdade, cada vez mais dependentes da produção jornalística exterior, de jornais como o NYT e o The Washington Post que, por aqui, tentam emular.
Trata-se, cotidianamente, de apenas reproduzir em outras palavras o que dizem seus jornalistas e analistas e de replicar nos grandes jornais brasileiros as colunas destas publicações americanas, notadamente hostis à política externa de Bush. Ignorar a imensa produção que segue em sentido contrário, ou seja, que apóia Bush e furtar-se a buscar eles mesmos o equilíbrio na produção local, eis o principal problema das editorias destinadas aos fatos internacionais neste país.
Por isso, o antiamericanismo na mídia brasileira ser tão feroz sem que ao leitor sejam dadas as chances de conhecer outras linhas de reflexão política ou de conhecer entrevistados que nadem para outro Norte que não seja aquele indicado pelos editores. A tal pluralidade da imprensa, um de seus princípios fundamentais, portanto, virou pó, neste caso, desde que os jornalistas decidiram que os leitores também precisam partilhar das mesmas opiniões importadas pelas cabecinhas ditas imparciais e originais das redações do eixo Rio-São Paulo.
Se por um lado negligenciam o noticiário pró-Bush, ele mesmo até maior dentro dos EUA que aquele produzido pelos dois principais jornais da costa leste, de outro reforçam a mistificação em torno do terrorismo, fazendo crer que se trata de uma luta grupal, encabeçada por alguns bandos de fanáticos muçulmanos e sem qualquer ligação com ditaduras como as de Saddam Hussein e Fidel Castro, a narcoguerrilha colombiana, o governo comunista chinês e a Rússia.
Daí talvez a expressão de incredulidade e deboche de muitos quando um desavisado leitor ousa ratificar as suspeitas da existência de uma imensa engrenagem terrorista e ideologicamente afinada com o socialismo cujo objetivo não é se não o de destruir as democracias ocidentais e os valores representados pelos EUA. Pobre é o país que depende destes "iluminados" para saber o que se passa além de suas fronteiras.
ANTIAMERICANISMO INFINITO
Aumenta o “círculo fechado” pró-ataque da Istoé
Esta semana, matéria na Istoé Dinheiro não assinada, resolveu atacar impiedosamente George W. Bush e entre uma calúnia e outra, o autor do texto afirmou que apenas um pequeno “círculo fechado” de assessores mais próximos do presidente dos EUA apóia a guerra contra Saddam (ver nota mais abaixo intitulada “A Istoé Dinheiro enlouqueceu”)
Pois além da pesquisa da Newsweek recém-divulgada e que aponta que o número de americanos favoráveis à uma ação que remova o ditador iraquiano de Bagdá subiu para 70%, agora uma nova pesquisa encomendada pela CNN diz que a popularidade do próprio Bush está hoje na casa dos 70%. Mais da metade dos entrevistados disse que o presidente já deu argumentos suficientes para abrir fogo contra Saddam.
O mínimo que o editor de Istoé Dinheiro poderia fazer na próxima edição de sua revista seria mandar algum dos seus redatores escrever uma matéria falando sobre o apoio a Bush, revelado em mais de uma pesquisa. Terá ele humildade para tanto?
A farsa do plebiscito que supostamente aferiu o humor da população sobre a adesão do Brasil à Alca chegou finalmente ao seu fim e culminou com a entrega do documento à embaixadora Donna Hrinak pela comissão encabeçada por Stédile, Zé Maria do PSTU e pelo representante da CNBB (notem quem são hoje os aliados da Igreja Católica no Brasil e depois me digam qual o futuro dela por aqui...)
O Globo não deu pelota para o encontro em Brasília mas a Folha mostrou que gosta do tema. Abriu-o com destaque na página A5 do seu primeiro caderno com direito a foto e tudo. Sílvia Freire, da sucursal na capital da Folha, escreveu no lead: “O resultado do plebiscito nacional sobre a Alca - em que quase 100% dos 10,1 milhões de pessoas que votaram condenaram a participação do Brasil no bloco econômico – foi entregue ontem à embaixadora......”.
Nenhum entrevistado ou comentário que revelasse as circunstâncias da realização do plebiscito, feito entre militantes, simpatizantes e amigos das entidades envolvidas na sua organização. Só o fato dessa patuscada acabar na embaixada mais importante do país já seria motivo de uma matéria à parte. Mas a resposta de Hrinak aos seus visitantes não deixou de ser interessante: “vocês estão discutindo Santa Claus”.
Claro, quem sabe hoje o que é a Alca e o que ela pode representar para o Brasil? A CNBB e o MST acham que os detalhes do acordo não importam. Importa é manter o pessoal desinformado e conduziram parte da opinião pública domesticada por ambos já há muitos anos na direção contrária a ele. Mas descascar isso não interessa à Folha.
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A vontade de ganhar a eleição é tão grande que o PT partiu para o abraço com quem se dispusesse a recebê-lo sem importar muito quem ele estava abraçando. O resultado da estratégia começou a dar seus primeiros resultados negativos justamente tendo como cenário o campo da estratégia militar.
A mídia ainda não percebeu isso direito (ou não quer perceber) mas a Folha chegou perto hoje. O título da matéria da reportagem local: “Lula se diz pacifista e evita ataque a Serra”. O tucano aproveitou a deixa na ESG: “Lula quer fabricar a bomba atômica”. O ataque ao acordo de não-proliferação de armas nucleares acabou indispondo o PT com a própria esquerda, mais exatamente com os ambientalistas globalistas (ou seja, o comunismo em escala planetária).
Mas o discurso de Lula é absolutamente sincero. À reboque dele, angaria o apoio dos militares que adoram uma guerra e que odeiam os EUA. Os ambientalistas que não se enganem. No poder, o PT vai usá-los até quando for conveniente tê-los como aliados. O problema agora é manter a estratégia do “paz e amor” e, convenhamos, defender uma escalada atômica não tem nada a ver com John Lennon.
Enquanto a imprensa brasileira continua repetindo os slogans esquerdistas que condenam eventual ataque dos EUA contra o Iraque, a guerra preparatória do conflito maior já começou desde o início do mês. Poucos leitores sabem disso detalhadamente e apenas hoje, 18, em O Globo, o correspondente José Meirelles Passos se aproximou dos verdadeiros fatos porque decidiu ouvir o que disse Donald Rumsfeld, homem com mais prestígio hoje em Washington do que Colin Powell. Mas é o que dá ficar fazendo a militância antiamericana ao invés de ir atrás da notícia. É muito blá-blá-blá e pouca ação. Parece que todos os jornalistas querem virar editorialistas ou algum Arnaldo Jabor da vida. Apurar a coisa, para valer, poucos fazem.
Resumidamente, o que está acontecendo é o seguinte: os americanos são ortodoxos quando o tema é guerra. Depois de alinhavarem alguns planos, submeteram aquele que acharam melhor a Tony Blair e começaram a agir. Os ataques aéreos de 5 e 7 de setembro foram um operação de grande envergadura e muito complexa. Foi contra a base H-3 no sul do Iraque e que dificulta uma ação de Hussein desta região contra a Jordânia e Israel (o Nahum Sirotsky já comentou isso).
No norte, os gringos estão com os turcos, curdos e turcomanos (só mesmo Saddam para fazer turcos e curdos jogarem no mesmo time). Ao sul, contam com o apoio de xiitas iraquianos doidos para tomar o poder. A estratégia passa por afunilar as duas forças e engasgar Bagdá mas, antes, é preciso enfraquecer o poder de reação de Hussein. E é isso que está ocorrendo e é isso o que vem sendo negligenciado pela mídia, pelo menos a que eu conheço mais de perto, a brasileira. Bem, parece que o correspondente de O Globo acordou mas seria bom alguém avisar as redações de que Bush resolveu ignorar os apelos da rapaziada.
Antiamericanismo infinito
O preconceito dos jornalistas brasileiros contra tudo aquilo que diga respeito à política externa de George W. Bush (coisa que inexistia quando o presidente era Bill Clinton), está deixando de provocar apenas um Jornalismo parcial, ideológico e partidário. Está provocando também um Jornalismo desonesto a partir do momento em que redatores, editores e repórteres passam a mentir a fim de justificar o que alegam em seus textos antiamericanóides.
Exemplo mais recente do que falo é a matéria de Istoé Dinheiro desta semana (página 26) sob o título “Bush Enlouqueceu”. Sem assinatura, o texto ataca Bush do começo ao fim, transforma Saddam em vítima, chama Nelson Mandela de “um dos grandes estadistas vivos” e repete o cacoete que opõe “falcões da Direita” aos “pacifistas de Esquerda”.
Mas esse mantra já nos habituamos a escutar. O problema começa quando o redator do texto diz que Bush está isolado e que não conta com o apoio de ninguém, exceto de "um círculo fechado" de colaboradores. Ora, recentíssima pesquisa da Newsweek revela que subiu de 61% para 70% o número de americanos que apóiam um ataque a Saddam. Isso só não é apoio majoritário na cabecinha dos jornalistas da Istoé Dinheiro.
No expediente da revista, estão os nomes de possíveis agressores da verdade e da inteligência do leitor de Istoé Dinheiro. Não é possível saber de fato quem escreveu a matéria contra Bush pois o autor escondeu-se no anonimato. Agiu corretamente. É preciso mesmo muita cara-de-pau para botar o nome num troço desses.
A polêmica levantada pelos jornais hoje sobre as declarações do físico iraquiano dissidente, Khidir Hamza, que afirma ter o Iraque utilizado urânio contrabandeado do Brasil na produção de armas nucleares, tem um defeito grave: não mostra que as relações entre os dois países na área já foram grandes e muito tumultuadas (veja textos abaixo) e, portanto, vão muito além daquilo relatado hoje por O Globo e pela Folha, por exemplo.
Especificamente sobre as declarações do físico, todos os especialistas caíram de pau em cima dele, o que não quer dizer que o que ele diz seja absolutamente desprezível. Me parece razoável supor que o Brasil tenha vendido Urânio para o Iraque legalmente em 82. Mas o que aconteceu a partir desta data é algo, no mínimo, nebuloso. A participação de um brigadeiro da reserva neste relacionamento, Hugo Piva, ainda que ele afirme ter agido sob ciência das autoridades, é outra coisa que precisaria ser melhor investigada. Guidalli.com, entretanto, recupera a leitura de parte do material levantado nos últimos anos.
As relações do Brasil com o Iraque de Saddam Hussein, no campo do comércio nuclear, vão muito além da venda de 24 toneladas de dióxido de urânio efetuadas no início dos anos 80. Segundo relatou o jornalista Roberto Godoy, no Estadão, em 1999, Saddam chegou a repassar à Iugoslávia em 97 o projeto do míssil ar-ar de médio alcance Al Taw'Han, o Raio de Fogo, parcialmente desenvolvido por técnicos brasileiros para equipar caças supersônicos de interceptação da aviação do Iraque
O Raio de Fogo é um míssil de combate aéreo no qual estavam trabalhando alguns dos 21 técnicos brasileiros levados ao Iraque no fim dos anos 80 pela agência HOP, do brigadeiro da reserva da Força Aérea, Hugo de Oliveira Piva. Além desse grupo, foram envolvidos no empreendimento os engenheiros Ronaldo Bataglin, Antonio Carlos Prado Júnior e Luis Carlos Mendes, especializados em eletrônica fina, que chegaram ao Iraque em 1987, atraídos pelo salário de US$ 6,5 mil oferecido pelo governo a técnicos estrangeiros
A impressão que se tem, ao ler as reportagens da ocasião, é a de que sobre Piva não havia controle algum e que o militar agia livremente. A Guerra do Golfo, em 1991, porém, interrompeu todos os projetos. Vejam o que conta Moisés Rabinovic em matéria para o Estadão em 96:
O governo brasileiro considerava o Iraque "um parceiro privilegiado", no final da década de 70, como explica o brigadeiro Hugo de Oliveira Piva, no livro Histórias Secretas do Brasil Nuclear, da editora WVA, lançado pela repórter Tania Malheiros no começo do mês, antes da prisão de Schaab. "O Iraque era nosso principal fornecedor de petróleo e grande importador de produtos brasileiros", ele acrescenta. "Com a queda do xá e a tomada de poder no Irã pelos fundamentalistas muçulmanos, o Iraque passou a ser o grande aliado do Ocidente para conter a expansão do fundamentalismo islâmico, principalmente nos países produtores de petróleo." E lembra: "As principais potências ocidentais passaram então a armar o Iraque e a dar grandes empréstimos para a formação de seu parque industrial."
Além do caso dos projetos de mísseis parcialmente desenvolvidos por brasileiros para o Iraque, um outro caso foi bem explorado pela imprensa em 96, o da prisão, no Rio, do químico alemão Karl Heinz Schaab, de 62 anos. Ele foi preso no Rio sob a acusação de ter vendido ilegalmente tecnologia nuclear do governo alemão para o Iraque no final dos anos 80, conseguiu visto temporário de permanência no País graças a um contrato de trabalho com uma empresa em São Paulo, conforme relata para o Estadão, o correspondente no Rio, Claudio Renato, em matéria de dezembro de 1996.
Schaab teria passado ao Centro Experimental de Aramar, da Marinha, em Iperó (SP) - considerado a vanguarda do programa "paralelo" atômico brasileiro -, a tecnologia de ponta para o enriquecimento de urânio por ultracentrifugação a gás. Notem o que conta Moisés Rabinovic sobre o alemão:
Um cientista da organização ecológica sediada em Washington Amigos da Terra (Friends of the Earth), David Albright, diz que o Brasil tem um denominador comum com o físico Schaab, porque "proveu informações sobre a centrífuga a gás para o Iraque". A relação do cientista com os militares brasileiros pode ter servido de ponte para os negócios com o Iraque. Ou vice-versa.
Esqueci de dizer que, além dos textos sobre cada um dos quatro principais candidatos à Presidência, Época desta semana, em sua reportagem especial de capa, também aborda os chamados "nanicos", este ano representados não por Garotinho, como o nome poderia indicar, mas por José Maria,do PSTU e Rui Pimenta, do PCO.
A jornalista de Época, Neusa Sanches, foi escalada para realizar o perfil do segundo, representante de um partido que é "o último bastião das autênticas idéias de esquerda", como ela diz logo no início da matéria à página 33. Tomando-se em conta tal afirmação, partidos como o PT, o PPS e o PSB, ainda que comandados hoje por ex-ideólogos marxistas ou ex-guerrilheiros e ex-agentes secretos com treinamento em Cuba , seriam agremiações de esquerda sim, mas moderadas e sem a tinta original que caracterizaria o esquerdismo do difuso PCO.
A precipitação da repórter, talvez seja apenas isso mesmo, uma precipitação. Se observasse melhor o que disse, seguramente Sanches teria que voltar atrás, pois se não planeja a eliminação de uma classe inteira, a dos empresários, como o PCO, o PT e o PPS seguem a cartilha socialista, seja nas declarações de seus candidatos, no perfil de seus líderes ou em seus próprios programas de governo. Portanto, não faz sentido para mim dizer que o PCO é o "último bastião" das "autênticas idéias de esquerda". As "autênticas idéias de esquerda" estão contempladas nos partidos maiores, ou quando eles tratam da questão agrária, do desarmamento civil, do relaxamento do aborto ou quando eles pregam a presença forte do Estado na vida social e econômica do país.
A jornalista de Época comete um grave erro de avaliação ao isolar o PCO e a mover para o centro do espectrograma partidário, partidos como o PT. Serve aos interesses dele, que luta para tornar-se palatável ao eleitorado que sempre o rejeitou justamente pelo seu radicalismo de esquerda? Prefiro acreditar que não. Aposto mais em sua momentânea incapacidade de ver as coisas como elas realmente são.
O perfil realizado por Época esta semana do candidato tucano à presidência, José Serra, assinado por Kaíke Nanne, não foi tão favorável ao ex-ministro da Saúde, se comparado ao de Lula, feito por Laura Greenhalgh, mas acabou saindo barato para ele. O problema está mais nas fontes chamadas para dar entrevistas sobre Serra, divididas entre apoiadores de Lula e “anti-Lulas”.
Assim , o texto acabou marcado pela sombra do principal opositor da candidatura governista, opositor apenas no sentido eleitoral, notem bem. Ideologicamente, Serra e Lula são muito afinados. Os principais problemas da matéria sobre Serra são os seguintes:
Fabiano Santos é cientista político e foi chamado por Época para criticar Serra. A revista não precisava, entretanto, chamar um petista de carteirinha que acha Lula “disparado o melhor” negociador entre os candidatos, o que mostraria maior maturidade democrática do candidato do PT. Santos vai além e diz que esta qualidade de Lula é “fator decisivo”. “O melhor candidato à Presidência é aquele que sabe negociar e conhece o Brasil em todas as suas dimensões”, completa. Desnecessário dizer quem ele é para o homem do Iuperj. Quem achou que a reportagem iria perguntar por que Santos acha isso de Lula, perdeu tempo.
Além do ranço antiamericano do repórter – “O caubói George W. Bush se comporta como o Durango Kid da política internacional”, a matéria também erra ao acreditar que a luta contra a indústria do tabaco tenha sido uma “briga política importante” do candidato. Ora, o que Serra fez foi apenas usar o imenso poder do estado para eliminar qualquer chance de propaganda dos fabricantes. Não consigo enxergar nisso qualquer mérito do então ministro. Houve redução do número de fumantes porque a propaganda desapareceu? Eu, francamente, não sei.
O mesmo problema verificado com o texto de Lula reaparece aqui. Época foi incapaz de tocar nas feridas de Serra, como o seu vínculo com Ricardo Sérgio, seu ex-tesoureiro de campanha e ex-diretor do BB acusado de tráfico de influência durante as privatizações do setor das teles. O máximo a que chegou a reportagem foi tocar no trivial: o incômodo fato de Serra ser o candidato de FHC, fato que ele tenta minimizar ao longo da campanha. Em resumo, mesmo sendo dócil com Serra, a revista acabou interpondo entre ele e o leitor um outro candidato, Lula. O leitor que tire suas conclusões.
Época traz esta semana uma reportagem especial que envolveu 25 jornalistas e dezenas de páginas. Tratam-se nelas da reta final da campanha e do estado de ânimo dos candidatos, entre outras pautas. Um perfil de cada um dos postulantes foi levantado pelo time de primeiro escalão da revista.
Em cada um deles, um crítico foi chamado para explicar porque tal candidato não deve fazer bom governo, afinal, é preciso mostrar conflito de opiniões. No caso de Lula, entretanto, o conflito se dá entre o que produziu a própria reportagem e o professor Fábio Wanderley Reis que, timidamente, esboçou algumas objeções ao candidato petista. Os aspectos, portanto, mais relevantes, especificamente sobre o perfil de Lula, seguem mostrados abaixo:
O título da matéria, à página 18 é:”A obstinação refletida em Lula”. A imagem é o candidato do PT penteando-se defronte a um grande espelho, num camarim, ajeitando-se para gravar o programa eleitoral gratuito. O texto é assinado por Laura Greenhalgh, destacada combatente à serviço do capitão Guilherme Ewelin, editor da reportagem especial sobre a campanha eleitoral.
A matéria é o que se pode chamar de um “panegírico”, ou seja, um elogio pomposo, como diria Laudelino Freire. A pauta obrigatória no que diz respeito a Lula e ao PT sequer foi levemente erguida. Suas relações com Fidel, Hugo Chávez e as Farc no âmbito do Foro de São Paulo, a organização que reúne terroristas e comunistas latino-americanos. Sua aproximação com os militares em troca da retomada do projeto nuclear brasileiro, sua vida de rico sem trabalhar, as relações de Olívio Dutra com o jogo do bicho e a sequência de ilegalidades cometidas pelo governo gaúcho na reforma agrária que vem realizando nos pampas. Nada, absolutamente nada de delicado ou problemático foi levantado pela repórter.
Ao contrário. Lula surge no perfil alinhavado por Laura Greenhalgh como um homem maduro, senhor de si, que não permite que os marqueteiros da campanha lhe digam o que falar. Como diz o título, é obstinado, uma qualidade positiva, alguém forte que não fraqueja ao menor embaraço, que não desiste diante de obstáculos.
O Lula de Laura é o mesmo personagem criado pelo PT, o tal de “Lulinha Paz e Amor” que vem fazendo enorme sucesso embalado pela midia que o adotou como verdadeira face do candidato. Lula tem pouca experiência? Sobre ele, diz frei Betto: “Ele não precisa de canudo. É inteligente e esbanja carisma”. Maria Victória Benevides, cientista política, ratifica o frei: “Lula exibe a legitimidade que ganhou na vida pública”.
Lula vai mesmo governar sozinho ou será um testa-de-ferro dos ideólogos do partido? Responde Marco Aurélio Garcia, o secretário da Cultura de Marta: “Só diz isso dele quem não o conhece”. Emenda Zé Dirceu: “Não se enganem, o comando será dele”.
A rede de amigos do candidato cede a vez para o próprio dizer que o Brasil precisa de alguém como Nelson Mandela, o homem colocado no poder pela Fundação Rockfeller em troca da abertura da exploração privada das jazidas de diamantes sul-africanas. Laura Greenhalgh, que talvez desconheça o fato, diz, ao contrário, que Mandela merece honras de herói do século 20 pelo legado de coragem e coerência política. Em que a repórter de Época baseia-se para afirmar tal coisa em seu texto eu ignoro.
A homenagem a Lula, em forma de perfil crítico, termina com chave de ouro. Vale a pena reproduzir o parágrafo final: “Lula está decidido a correr o risco. Prefere crer na capacidade de reação da décima economia do mundo.. nos fundamentos éticos de um governo balizado pelo PT (logo quem meu Deus) e, bem no íntimo, no desejo de consumar um papel que a História já lhe outorgou”. Repito: “... no desejo de consumar um papel que a História já lhe outorgou “. Laura Greenhalgh já está escalada para escrever a biografia autorizada de Lula. Não se encontra jornalista tão fã assim todos os dias.
Leia amanhã: outro panegírico, “ma non troppo”, de Época. Desta vez para Serra.
Numa iniciativa inédita na Internet, e porque o assunto é de extrema gravidade, esta página está lançando neste domingo histórico, o SALE, um serviço que irá orientar os leitores vítimas dos ataques da revista Época
contra a sua inteligência.
Nosso serviço de estréia, absolutamente gratuito (por enquanto hein..), irá analisar a mais nova edição da revista, a de número 226, de 16 de setembro de 2002. A que tem na capa a imagem dos quatro cavaleiros do Apocalipse, sendo que um deles, o preferido dos jornalistas da publicação dos Marinho, em primeiro plano e de expressão benevolente e cordial. Sim , o da barba.
O ataque da revista contra seus desprevenidos eleitores (perdão, leitores) esta semana foi duríssimo o que nos obriga a dividir nosso serviço de prestação de socorro a eles em duas etapas. A artilharia dos jornalistas de Época se concentrou na reportagem de capa, 50 páginas sobre a campanha eleitoral em sua reta final. Foram destacados pelo general Paulo Moreira Leite seus melhores homens para a operação, com o capitão Guilherme Evelin no comando de 25 soldados. Tal agrupamento foi implacável contra os inimigos, ou seja, todos aqueles que pagaram R$ 5,50 para obter boa informação e todos os que foram atacados dentro de suas casas com o exemplar-bomba deixado pelos ignominiosos revolucionários de Época.
Nas próximas horas, não percam, portanto, o relato frio mas emocionante de tal evento iniciado assim que a edição desta semana de Época deixou, perfilada, sua linha de montagem em direção às ruas.
Assim como o partido bolchevique na Rússia de 1917 e depois, nos anos 30, já sob Stálin, o PT de Luis Inácio Lula da Silva e José Dirceu tem a odiosa mania de imputar aos adversários a culpa pelos próprios problemas, erros ou incompetência. Isso acontece desde que o PT nasceu e quem não se lembra de já ter ouvido seus próceres no Congresso dizer que acusações contra o partido faziam parte de um complô ou de uma armação para desestabilizar o PT...O cacoete é tão frequente que o comportamento dos líderes petistas acabou entrando para o folclore que cerca o partido.
No caso dos comunistas, o código penal soviético, em seu artigo 58, elencava uma série de ações passíveis de prisão, confinamento em campos de concentração e, nos casos mais graves (às vezes nem precisava ser grave), fuzilamentos. Entre os crimes do artigo 58 estava o de sabotagem e sua existência ali servia sobretudo para que os comunistas pudessem livrar-se dos inimigos ideológicos, num primeiro momento.
Com o tempo e o avanço do totalitarismo soviético, mais tarde estas acusações atingiram operários, civis, ex-guardas do Czar e gente é claro da própria engrenagem do partido mas que Lênin, e depois Stálin, queriam ver presos. Todos supostamente culpados por “sabotar” a revolução.
Dentro desta estratégia, os comunistas criavam os mais engenhosos simulacros de investigação e julgamento, caluniavam suas vítimas no Pravda, forjavam testemunhos sob coação. Foi assim que Stálin agiu no período do “Grande Terror”, de 36 a 38, eliminando todos os seus opositores com a deportação em massa ou com a morte.
Mas voltando à campanha eleitoral, estava demorando acontecer a chance que o PT aguardava para gritar “Sabotagem!!” contra seus opositores. O momento surgiu no Rio, logo após a ação de Beira-Mar em Bangu 1 e que deixou clara, mais uma vez, a total inoperância do governo do PT carioca diante da escalada do tráfico dentro do “presídio de segurança máxima”.
Ao invés de assumir sua cota de responsabilidade no caso, vejam o que Lula disse ao Globo de ontem, sábado, em matéria com o título “Lula diz que Benedita é vítima de sabotagem”:- Essa companheira historicamente é vítima de calúnias, de sabotagens e de mentiras...O candidato comparou o episódio de Bangu 1 ao dos arrastões na orla que teriam prejudicado a candidatura de Benedita em 1992. Uma afirmação sólida como gelatina.
Se fora da Presidência Lula já usa este artifício para safar-se das responsabilidades, na Presidência isso deverá acentuar-se de forma espetacular. Qualquer pequena crítica, objeção ou simples comentário que for na direção contrária do que pretende o partido, não serão tolerados e tome gritos de “Sabotagem!!!!”. Há diferenças, porém, entre a Rússia da primeira metade do século passado e o Brasil de hoje. Vamos ver o que acontecerá quando a mídia reagir aos primeiros erros do governo federal sob comando do PT.
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Editor: Sandro Guidalli