A partir do momento em que a mais elementar regra do jornalismo de reportagem, o distanciamento do fato para melhor entendê-lo e relatá-lo aos leitores, é sistematicamente ignorada por quem o faz, seria razoável não se deixar surpreender com outras práticas e comportamentos que têm este desprezo pela isenção de abordagem o seu ponto de partida.
Mas a reportagem de O Globo superou qualquer expectativa que pudesse ser negativa a respeito da cobertura do encontro de Lula com artistas e intelectuais, que já o apóiam há 13 anos, em churrascaria do Rio na quinta-feira passada.
Pelo menos quatro repórteres foram escalados para cobrir o evento. Todos eles o fizeram de forma apaixonada. Bote-se aí a mão de um editor simpatizante e temos um resultado excelente para o candidato do PT, muito bom para repórteres e editores e para os leitores petistas e péssimo para os demais ou para quem espera aquele mínimo de distanciamento de jornalistas imbuídos em reportar os acontecimentos.
Impossível neste espaço analisar toda a cobertura do jornal carioca, afinal, foram duas páginas totalmente preenchidas por ela numa edição em que Lula foi, disparado, sua maior estrela. Logo na chamada da capa, em foto de cinco colunas, o título: “A Constelação de Lula”. Na imagem, o candidato entre atrizes de novela, principalmente, Chico Buarque e Augusto Boal.
No texto âncora interno, os primeiros relatos do encontro. Vejam o lead: “Parecia um grande comício, mas as estrelas estavam na platéia. E a maioria delas era tiete da grande estrela da festa, o petista Luiz Inácio Lula da Silva, que fez uma entrada triunfal, aplaudido de pé pelos cerca de 400 artistas, intelectuais....Havia coquetel com chope e caipirinha porque ninguém é de ferro. E quase todos saíram bêbados de emoção...”.
A única tentativa de crítica ao candidato, a falta de uma política para o setor cultural, em que pese ele ser candidato desde 1989, acabou quase esquecida pela reportagem, que preferiu utilizar a seguinte manchete na segunda página dedicada ao evento e ao tema, especificamente: “Revolução cultural de Lula ainda sem receita”. Ora, como pode uma revolução sem receita? Se uma revolução, como pretendem os repórteres de O Globo, não tem qualquer diretriz ou proposta, não é então revolução de espécie alguma. Não é nada. Em resumo, o PT não tem o que propor na área exceto a velha retórica de “cultura para todos” e blá, blá, blá..
O adesismo triunfal da reportagem foi muito além. Diante de um improvisado e chato José Celso Martinez Corrêa, que, em “discurso” ousou dizer que não sabia ainda se deveria votar em Lula, a edição e a reportagem logo se adiantaram a dizer que “Lula não deixa o diretor teatral sem resposta”, mais interessado, vejam só, em seus próprios projetos pessoais. “De olho no próprio Bexiga”, dizia o título do quadro com o diretor teatral e sua “performance” no Porcão Rio´s, o restaurante alugado para a festa do clube dos amigos de Lula.
Os velhos comunistas Celso Furtado e Antonio Cândido estavam lá e a reportagem foi ouvi-los. Os títulos: “Eu admiro esse rapaz”, no caso do economista e “Tenho confiança no PT e em Lula”, no caso de Cândido, um dos fundadores do PT. Nenhuma crítica, nenhum comentário menos elogioso foi revelado ou deixou-se aparecer nos títulos, manchetes, legendas, sub-títulos da cobertura. Como podemos ver, tudo não passou de uma grande comemoração entre imprensa e fato.
Fica talvez para Chico Buarque o melhor de tudo o que foi relatado. Sincero, o compositor admitiu que não acredita que apoio de artistas signifique votos. “Não acredito nessa importância toda”, disse. Mas a reportagem de O Globo acredita. E muito.
Escrevi o texto abaixo originalmente para o portal Comunique-se. Quem quiser recuperar o início da polêmica e os respectivos textos basta acessar o portal citado ou pedir o material pelo e-mail guidalli@terra.com.br
Em um polido texto, a diretoria de Publicidade, Imprensa e Relações Públicas da Embratel, retrucou artigo escrito nesta coluna que, por sua vez, criticou a abundância de prêmios a que hoje em dia concorrem milhares de jornalistas do país.
Na opinião deste colunista, mais do que reconhecer a capacidade profissional dos vencedores, estes prêmios servem antes de mais nada para azeitar a relação entre empresas, entidades e jornalistas e assim criar uma atmosfera de cordialidade interesseira entre todos eles.
Um destes prêmios, que a meu ver reforçam o relacionamento camarada entre repórteres e empresas, é o Prêmio Imprensa Embratel, realizado pela ex-estatal anualmente e que envolve a participação de 13 profissionais, sendo que pelo menos cinco deles são ou foram dirigentes sindicais e de associações de classe, como a ABI e o sindicato dos Jornalistas do município do Rio.
Pois foi justamente o fato de ter eu criticado a participação como jurados no Prêmio destes sindicalistas, no meu entender absolutamente incapacitados para examinar o trabalho dos concorrentes e chamados para referendar o clube de amigos, que levou a diretoria da Embratel a responder meu artigo. Segundo ela, entre os integrantes do juri há apenas um representante do sindicato do município do Rio, Nacif Elias e outro, da Fenaj, no caso, sua presidente, Beth Costa.
A resposta da Embratel, quer ela queira ou não, sustenta, entretanto, o que escrevi. Ademais, vai adiante do que eu mesmo sabia, pois além dos dois sindicalistas citados, na lista de jurados elencados em seu texto pode-se encontrar, por exemplo, Alberto Jacob Filho, da Arfoc e diretor do sindicato do Rio, Cícero Sandroni, da já citada ABI e Janice Caetano, ex-presidente do mesmo sindicato presidido hoje por Nacif Elias.
Fica assim muito clara a participação de sindicalistas no resultado do Prêmio Imprensa Embratel, estejam eles atualmente exercendo cargos de direção ou não. Se por um lado isso apenas reforça o estofo com o qual amparo minha opinião, a resposta da Embratel ao meu artigo, na verdade, não tem como principal trunfo ratificá-la. Ela vai além ao me deixar à vontade para uma nova crítica, desta vez no que diz respeito à premiação em si.
Na edição do ano passado do prêmio outorgado pela operadora da WorldCom, por exemplo, seu principal vencedor foi o jornalista da TV Globo e atual correspondente da emissora em Londres, Caco Barcellos. A reportagem premiada pelo júri formado pela Embratel, em boa parte, como vimos, por sindicalistas, relatava em detalhes como um casal de terroristas havia sido morto pela repressão militar que, depois de matá-los, teria simulado um acidente rodoviário a fim de esconder a verdadeira causa de sua morte. Baseando-se principalmente no relato de um desertor do exército, a reportagem do premiado repórter é um “case” jornalístico negativo, ou seja, serve muito bem para que estudantes da profissão não repitam o que fez o autor da reportagem, em que pese sua boa fama.
Uma análise mais atenta e distante dos acontecimentos levaria o repórter a perceber as falhas de argumentação de sua fonte. Entre elas, pela ordem:
1. Como pôde uma vez assassinado o casal de terroristas, - segundo a fonte de Caco, morto em 8 de novembro de 68, - o mesmo ter participado de um assalto três meses depois, segundo relato de fontes insuspeitas, como Jacob Gorender, o historiador comunista mais famoso do país?
2. Se na simulação do acidente rodoviário as vítimas foram colocadas já mortas dentro do carro, como se explicam as marcas do freio dos pneus a poucos metros do tombamento do veículo? A própria reportagem mostrou as fotos com as marcas da frenagem o que levaria, no mínimo, qualquer pessoa a aceitar a hipótese de que o acidente de fato ocorreu. (Obviamente em outra data que não a citada pela fonte de Caco.)
3. Além disso, como poderia a fonte de Barcellos estar na ativa na ocasião, como ele afirma, sendo que havia desertado oficialmente, segundo documentos, dois meses antes do suposto assassinato do casal pelas forças de repressão?
Diante destas questões e de outras não levantadas aqui neste espaço, o júri do Prêmio Imprensa Embratel, jamais, por uma questão de honestidade para com os fatos, poderia ter concedido tal distinção ao jornalista Caco Barcellos em detrimento de outro competidor, talvez, mais merecedor do prêmio. Nem ele, Caco, inclusive, poderia tê-lo recebido. Talvez por vaidade, o quase sempre correto repórter da Globo, no entanto, aceitou-a.>
Finalmente, não só repito aqui minhas observações críticas sobre o prêmio da Embratel e de outras empresas já feitas em artigo anterior, como também deixo claro minhas dúvidas quanto à honestidade no julgamento dos trabalhos concorrentes. Desnecessário seria também dizer que lamento sinceramente que, muitas vezes, jornalistas de reconhecido valor se deixem julgar por uma banca cujos participantes, em certa parte, não têm condições de selecionar, analisar e concluir sobre o trabalho de si mesmos, que dirá dos outros. Por isso, aguardo as próximas premiações da Embratel. Quem sabe elas me surpreendam, desta vez, de forma positiva.
Em seu artigo de hoje na Folha, o veterano articulista Jânio de Freitas, a maior estrela do jornal dos Frias, ao lado de Clóvis Rossi, disse mais ou menos o seguinte, resumidamente e com outras palavras:
Diante do aumento da disputa verbal entre a candidatura supostamente descendente de Ciro e a candidatura supostamente em ascendência de Serra, a corrida sucessória ganha animação mas perde em qualidade. Na opinião de Jânio, “isso fará a alegria dos que não superaram as exasperações da adolescência e precisam muito da agressividade tola, própria ou alheia”. Diante disso, conclui o jornalista que pretendentes à Presidência feitos “na base de desaforos” sugerem aos eleitores inteligentes e sérios que neles não percam seu voto.
Seria o caso de perguntar aqui o seguinte: Jânio de Freitas está então com isso sugerindo o voto em quem? Ao descartar com base na sua opinião o voto em Ciro e Serra, sobram Lula e Garotinho. Não me parece razoável supor que Jânio esteja apoiando, pessoalmente ou nas entrelinhas, o ex-governador do Rio. Resultado: Jânio fez hoje propaganda da candidatura Lula, fato aliás que vai ao encontro do histórico ideológico do articulista, simpatizante do petismo há muitos anos.
A postura do articulista, alías, não difere muito da maioria dos seus colegas de opinião. Ela reforça um trabalho maior, feito pela reportagem da editoria política dos jornalões que, como disse ontem, tenta fazer crer ao eleitor que Lula é um político maduro, de temperamento calmo e que hoje está acima das disputas mais mesquinhas da corrida à Presidência. Como se o comando da campanha petista pudesse manter a mesma verve se estivesse na posição que está Serra e não na confortável liderança que hoje ostenta e como se não estivesse eventualmente tramando nada nos bastidores para desestabilizar esta ou aquela ameaça, quando oportuno.
Ou Jânio de Freitas ainda possui dentro de si um resquício de ingenuidade que a experiência ainda não lhe tirou ou ele mesmo acredita que os inocentes aqui podem ser seus próprios leitores ao achar que não está, na prática, cofiando carinhosamente a barba do seu candidato preferido. Tudo seria mais honesto se os articulistas revelassem suas preferências ao invés de maquiá-las de forma tão cínica.
Não é segredo para ninguém que a cada dez jornalistas nas redações, nove são simpatizantes, militantes ou simplesmente eleitores de Luiz Inácio Lula da Silva. Além de os próprios jornalistas não o esconderem, isso é patente no resultado da produção editorial dos jornais, na condução das pautas, no tema dos artigos de opinião, etc, etc.. Eu mesmo já vivi este ambiente petista quando iniciei a profissão, em plena campanha presidencial de 1989.
Meus contatos com a militância do PT dentro e fora dos jornais, portanto, já tem uns bons anos.
O que vem chamando a atenção nesta campanha eleitoral, entretanto, está longe de ser a preferência, bem conhecida, dos jornalistas por Lula. É a insistência com que eles agora tentam mostrar o lado cada vez mais “light” do tetracandidato. Lula, sob a interpretação da imprensa, teria mudado tanto sua postura e suas idéias que os banqueiros, diplomatas e até o mercado financeiro já teriam se rendido ao novo Luiz Inácio.
A mudança, portanto, não teria sido apenas de vestuário. Além dos ternos e das gravatas impecáveis, dos charutos e da ingestão de vinho da melhor qualidade, Lula teria mudado ideologicamente ao longo dos últimos anos, aproximando-se da “direita da esquerda”. Suas novas alianças seriam prova disso. Assim, o objetivo da estratégia da mídia petista vem ao encontro dos objetivos do próprio PT que é o de ganhar a eleição com a imagem suavizada pela imprensa para depois poder governar ao seu melhor estilo, representado hoje pelo governo Olivio Dutra do Rio Grande do Sul. Este, definitivamente, não tem absolutamente nada de “light” e é o mais puro socialismo petista, da velha militância comunista.
A mais nova amostra da estratégia da mídia pró-Lula deu-se nesta quarta em O Globo em texto assinado por Adriana Vasconcelos e Isabel Braga. As duas dizem logo no lead da matéria que depois de impressionar os banqueiros, Lula agora impressionou diplomatas “de diferentes partes do mundo”. Para amparar a afirmação, a reportagem cita algumas declarações de diplomatas que, ao contrário do que ela, a reportagem, pretende, não reforçam em nada o que foi dito logo no início da matéria.
Para começo de conversa, os diplomatas ouvidos por O Globo tem uma representatividade muito relativa, para não dizer pífia. Disse uma polida embaixadora da Dinamarca: “É um político de verdade e é bem articulado”. Convenhamos que a sra. Anita Hugau disse absolutamente nada demais e teria falado isso a qualquer outro candidato. Ou não?
Mais adiante, Gonzalo Montenegro, da Bolívia, um país de excepcional importância, disse sobre Lula: “Mostrou idéias originais sobre os problemas brasileiros e internacionais”. Fazendo de conta que a declaração do embaixador da Bolívia é importante, o que ela tem de anormal para a reportagem dizer que Lula impressionou os diplomatas, tomando-a como exemplo legitimador da sentença afirmada?
O embaixador do Paraguai também falou bem de Lula e a embaixadora dos EUA, Donna Hrinak, mesmo sem ter dito nada, acabou involuntariamente reforçando a reportagem de O Globo ao deixar-se fotografar sendo abraçada pelo candidato do PT em momento de evidente cordialidade. Para finalizar, a reportagem exalta declaração do representante da União Européia no Brasil, Rolf Thimans. “ O encontro agradou muito”, disse o diplomata, lacônico, para acrescentar apenas que Lula deixou mais claro seu interesse em aprofundar o Mercosul.
Para O Globo, a fala do europeu deve ter sido algo inesperado e de grande impacto, pois outra coisa não poderia justificar o assanhamento da reportagem perante o encontro entre seu candidato preferido e um punhado de diplomatas estrangeiros. E assim ficamos combinados: fingimos que acreditamos em O Globo e O Globo finge que acreditou nos diplomatas entrevistados por sua reportagem.
A quarta não foi muito boa para o velho jornal da Irineu Marinho. Verdade seja dita: lê-lo diariamente faz mal, trata-se de um jornal ruim, não há novidade nisso. Mas às vezes até nisso, no direito que cada jornal tem de ser ruim, - pois é difícil fazer um jornal bem feito com o material humano à disposição nas redações, - O Globo extrapola.
O caso é o seguinte: Anthony Garotinho andou reclamando no Bom Dia Brasil que a imprensa não lhé dá bola. Ele tem razão. Mas a culpa não é necessariamente dos editores e sim das pesquisas eleitorais que mostram seu pífio desempenho na corrida sucessória. Por isso, sua candidatura não tem o apelo que tem, por exemplo, a candidatura de Ciro Gomes.
Pois bem. O queixume do postulante do PSB foi parar no jornal dos Marinho. Ao lado do texto, vejam só, o editor colocou um quadro que mostrava um levantamento do Iuperj da cobertura dos jornais sobre os candidatos e que mostra exatamente que Garotinho é negligenciado mesmo pelos jornalões. Os números do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio, assim, ratificam o que reclama Garotinho no texto contíguo aos gráficos. O esdrúxulo começa aqui: O Globo queria dizer com o quadro exatamente o contrário, que as queixas de Garotinho são asneiras.
A coisa piora quando o editor publica uma matéria abaixo dos gráficos com o coordenador do Iuperj, Marcus Figueiredo. Assinada por Renato Galeno, da reportagem de O Globo, suponho eu, a matéria dizia uma coisa no título e no lead e dizia outra, completamente diferente, no resto do texto. Reflexo da confusão editorial do jornal. O título era: “Pesquisa mostra equilíbrio dos jornais na eleição” e dentro do texto dizia: “Nos dados mais recentes, referentes ao intervalo entre os dias 7 e 20 de agosto, as três publicações (O Globo, Folha e Estadão) deram mais reportagens sobre Ciro Gomes, seguido de Serra e Lula. Garotinho foi o menos citado nos três jornais”.
O título se refere ao fato de os três grandes jornais pesquisados apresentarem a mesma tendência de cobertura ou se refere a um equilíbrio, como vimos, inexistente, em relação ao espaço que concede aos quatro candidatos? O coordenador do Iuperj diz no lead que as reclamações de Garotinho não têm fundamento. Mas como? Ele mostra justamente o que diz Garotinho. A diferença está na causa do fato. Para o candidato, ele é desprestigiado pela mídia e para outros, como eu mesmo acho, a causa está em que sua candidatura vai muito mal das pernas. E é exatamente isso que diz inclusive o coordenador do Iuperj no próprio lead da matéria.
Algumas interrogações: 1) Foi Marcus Figueiredo mal interpretado ou sofreu o contágio da confusão mental do editor e do repórter de O Globo? 2) O editor leu o levantamento feito pelo Iuperj? 3) O repórter não percebeu que Garotinho tem razão (independente de errar na avaliação da causa) quando diz que aparece menos na mídia impressa, ao ver os números do Iuperj?
Quando eu digo que os jornalistas brasileiros estão perdendo a capacidade de raciocinar (ou não a adquiriram ainda) não estou, como podemos ver, exagerando......
No embalo da Folha, o tablóide gaúcho Zero Hora também resolveu abordar a liberação dos documentos que eram guardados pelo governo americano e que revelam mais detalhes sobre a operação que uniu Brasil e Argentina na luta contra os opositores dos regimes militares nos dois países.
São mais de 4, 5 mil telegramas em que são contadas as histórias da captura de guerrilheiros, como os montoneros Horacio Campiglia e Susana de Binstock, no Galeão, quando desembarcavam no aeroporto em 80. Por volta desta época, o governo argentino ainda enfrentava problemas com a oposição mais hostil, de quem o Brasil, bem antes disso, já havia conseguido se livrar através de operações bem desenvolvidas pelo Exército. No auge desta guerra, alguns órgãos de repressão usaram a tortura como forma de obter informações valiosas para o desmembramento da oposição armada, fato ampliado até o limite máximo possível pela imprensa, que, de uma forma geral, concentra-se nos abusos dos militares e esquece contra quem eles lutavam e o que realmente queriam, ou seja, instalar por aqui uma ditadura muito pior, a comunista.
Mas voltando ao Zero Hora, em sua edição de sexta, 23 de agosto, José Mitchell, em reportagem especial, também segue pelo mesmo caminho dos colegas da Folha, Marcio Aith e Marcelo Starobinas. Em resumo: interpreta e relata tudo de acordo com a versão da história contada pelos derrotados sem se preocupar com a opinião ou com a interpretação dos fatos de quem lutou do outro lado, os militares. Assim, o leitor do jornal, menos tarimbado nessas coisas, acaba a leitura achando até natural e justo o reconhecimento pecuniário que pretendem obter os familiares das “vítimas” da operação de inteligência que resultou na morte dos guerrilheiros, desaparecidos desde que foram capturados. Esta é a linha principal da matéria do sr. Mitchell, ágil em entrevistar a ativista argentina Claudia Allegrini, mulher do terrorista desaparecido Lorenzo Viñas e lerdo em procurar alguém que dê outra versão sobre os acontecimentos ou que diga sinceramente em que circunstâncias estes terroristas desapareceram.
Aliás, ela e outros familiares querem que o Brasil pague R$ 130 mil pelo desaparecimento do marido e de outros opositores.
Com o título de “Documentos expõem papel brasileiro na repressão”, a matéria da Zero Hora também não esquece o maior dos chavões do tema da repressão, e escreve a expressão “anos de chumbo” ao lado da manchete como para reforçar o ambiente criminoso ao que o leitor será levado dali em diante. Como se vê, mais uma vez, resta a pergunta: José Mitchell ignora a história que conta parcialmente ou a conhece integralmente e omite parte dela?
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Editor: Sandro Guidalli